Harari: trabalho do futuro precisará de físico e coração – 06/11/2025 – Tec
O historiador israelense Yuval Noah Harari diz que recebe uma pergunta com frequência: “O que eu deveria ensinar aos meus filhos?”. De acordo com ele, que já teve seus prognósticos para o futuro citados por presidentes, ninguém sabe com certeza quais serão as habilidades necessárias em um mundo dividido entre humanos e modelos de inteligência artificial capazes de realizar diversas tarefas.
Para o escritor, conhecido pelo best-seller “Sapiens – Uma Breve História da Humanidade (Companhia das Letras)”, o melhor caminho é incentivar as crianças a desenvolver habilidades intelectuais, físicas e sociais —as quais ele chama de “habilidades do coração”.
Como exemplo, Harari compara um acadêmico a um médico. O pesquisador, treinado para analisar grandes quantidades de informação e fazer diagnósticos, seria facilmente automatizável. Já o médico precisa de habilidades físicas e sociais para lidar com crianças birrentas ou até com criminosos, se necessário. “Isso é muito mais difícil de automatizar”, afirmou durante palestra no evento HSM+, realizado em São Paulo nesta quinta-feira (6).
Mesmo a ideia corrente no Vale do Silício de que seria uma grande vantagem aprender a programar enquanto se é jovem estaria datada, segundo o historiador. “Talvez em cinco anos, quando seu filho sair da universidade, não haverá motivos para contratar programadores.”
O historiador acredita que as IAs mais avançadas também serão criativas. “Encontramos algo que, em alguns anos, será muito melhor do que nós em contar histórias.” Ele trabalha em um novo livro, que deve demorar de dois a três anos para ser concluído. “Eu suspeito que haja uma boa chance de que este seja o meu último livro, porque, quando for lançado, as IAs poderão escrever livros melhores do que eu.”
Harari também prevê que, em cinco anos, há 50% de chance de as IAs já conseguirem escrever livros melhores do que os seus ou produzir filmes superiores aos de Spielberg. “Em 20 anos, eu acho que é certeza”, completou.
No entanto, ele ressalta que certas habilidades continuarão insubstituíveis. “Se você puder trazer corpo e coração, a IA não poderá fazer isso —as tradições brasileiras da capoeira e do futebol são exemplos”, disse.
O autor afirmou ainda estar mais preocupado com as implicações políticas e econômicas da IA do que com o uso de robôs assassinos nas guerras. “Um robô precisa funcionar dentro do espaço físico, e isso cria muitas restrições. Basta olhar as promessas sobre automóveis autônomos —todos os anos as montadoras dizem que a tecnologia chegará no ano seguinte”, exemplificou.
Para ele, implementar automações na burocracia, no sistema financeiro ou nas redes sociais é muito mais simples. “As plataformas já tomam decisões editoriais sobre quais informações as pessoas podem ver, e isso já causa aborrecimento.”
O problema, segundo Harari, pode se agravar ainda mais no mercado financeiro. Ele lembrou que a bolha imobiliária que provocou a crise de 2008 abalou a confiança no sistema financeiro. “Quase ninguém entendia, mas as pessoas que criaram aquilo ganharam bilhões de dólares por alguns anos.”
Com a IA, o risco é que ninguém compreenda o que está acontecendo no sistema financeiro. A tecnologia poderia acelerar o fluxo de transações e aumentar o nível de abstração das operações, já que consegue processar muito mais informações simultaneamente. “Nem mesmo os vencedores do Prêmio Nobel de Economia poderiam entender essas coisas.”
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