Quem disse que a Bolsa precisa te devolver o que não entregou? – 06/06/2025 – De Grão em Grão
Você acha que a Bolsa está atrasada e que, por isso, vai compensar com uma alta forte? Muita gente pensa assim. Afinal, se o Ibovespa anda de lado há quase quatro anos e se diz que o mercado costuma render entre 10% e 15% ao ano, então ele estaria devendo algo em torno de 40% a 60% de retorno, certo? De fato, tenho ouvido bastante esse argumento para justificar a compra nesse momento. Mas esta justificativa não é adequada.
Esse é um dos erros mais comuns — e perigosos — que o investidor comete: confundir retorno médio com obrigação de compensação. É como em um cassino, onde o jogador acredita que, só porque um prêmio costuma sair a cada 100 rodadas, se ele chegou até a 99ª sem ganhar, a próxima tem mais chance de ser a premiada. Mas a roleta não tem memória. E o mercado também não. Para entender por que esse raciocínio falha, vale a metáfora feita pelo gestor Daniel Goldberg, da Lumina.
Imagine que você vai de carro de São Paulo ao Rio. O tempo médio do trajeto é de seis horas. Mas, logo no início da viagem, um acidente trava a estrada perto de São José dos Campos. Você fica parado por cinco horas. Quando o trânsito finalmente anda, pensa: “Falta uma hora para fechar a média. Se eu pisar fundo, chego no tempo previsto.” Mas o carro não vira um foguete só porque você ficou parado. Não há compensação automática. O que determina a sua chegada agora são as condições reais da estrada — não a estatística.
A mesma lógica vale para a Bolsa ou para outros mercados de risco. O mercado não está “devendo” retorno. Ele responde a variáveis reais do momento: taxa de juros, resultados das empresas, fluxo de capital, risco fiscal, ambiente externo. A média histórica de retorno — 10% ou 15% ao ano — serve como bússola, não como promessa. E essa bússola foi traçada com base em longos períodos de euforia, quedas violentas e marasmos prolongados.
O fato de o Ibovespa ter rendido o equivalente a menos de 4% ao ano nos últimos quatro anos, não significa que ele esteja prestes a disparar para compensar o tempo quase parado. O mercado não tem memória. E, ao contrário do que o nosso instinto sugere, o que não aconteceu nos últimos anos não se torna mais provável agora. A estatística não tem senso de justiça.
Esperar uma valorização forte apenas porque ela “já passou da hora” é como confiar que o carro vai a 500 km/h depois de um engarrafamento. E esse tipo de expectativa gera frustração — e, muitas vezes, decisões ruins.
O investidor que compreende isso se posiciona melhor. Em vez de aguardar um milagre estatístico, analisa o cenário atual, busca alternativa e monta uma carteira coerente com o que o presente oferece.
Porque, na Bolsa, não se ganha esperando que o passado seja corrigido — mas sim ao tomar decisões consistentes com o que o mercado mostra agora.
Michael Viriato é assessor de investimentos e sócio fundador da Casa do Investidor.
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